sexta-feira, 1 de abril de 2022

A capacidade de se adaptar à tristeza

Nos primeiros dias, essas cenas provocavam impacto


Numa guerra, dor de um pai ao ver a filha perto da morte não choca mais 


Luís Alberto Alves/Hourpress

A guerra na Ucrânia já passou de um mês. A violência, as explosões das bombas, os crimes de guerra, as pessoas feridas, os corpos dos mortos espalhados pelas ruas. Nos primeiros dias, essas cenas provocavam impacto. Mas agora tudo isso cai na rotina. Algo que não mexe mais com o emocional. Porém, qual a razão para tudo isto?

Nós temos a capacidade de adaptação a qualquer situação. Lembre-se quando comprou o seu primeiro automóvel. O cuidado para colocá-lo na garagem, para dirigir nas ruas e até para abastecer. Tudo era novidade. Passados alguns meses, ele já não desperta atenção. Caiu na rotina. Lembra-se dos primeiros dias de casado? A paixão e o carinho. E após dez anos de casamento? Continua o mesmo clima?

Com a morte ocorre o mesmo. Você fica sem chão quando recebe a notícia de que alguém da família morreu. Pai, mãe, filho, esposa, irmão. A tristeza machuca o coração. O apetite e a sede desaparecem, junto com o sono. No velório, o clima é de final de mundo. Parece que a vida perdeu o sentido. Após alguns anos, essa sensação não é a mesma. Ocorreu a adaptação!

Síria

Tanto para tristeza ou para alegria, nós conseguimos nos encaixar. Poucas pessoas ficam presas nestas situações. O luto passa. Com a guerra é a mesma coisa. Quantos se lembram que a Síria está mergulhada há 11 anos num conflito que já dizimou parte de sua população, inclusive com a ajuda das Forças Armadas russas?

Não sei quanto tempo vai durar a guerra na Ucrânia. Porém, aos poucos ela se encaixa na rotina das pessoas. Por causa da dureza de coração, muitos deixam de olhar para o drama que aquela população enfrenta ao ver o seu país invadido pelo exército inimigo. Não ficam chocados ao ver um filho chorando ao lado do corpo do pai morto, nem da mãe em prantos ao perder o filho.

É como se aquilo não tivesse nenhuma ligação conosco. Lembro-me de uma frase escrita na lápide de um túmulo que dizia o seguinte: “Não se preocupe, você será amanhã, o que sou hoje”. No velório poucos imaginam que em algum dia, mais a frente, ele estará naquela situação. Algo certo! Porém, não pensamos nisto. Como se fosse algo distante, sem nos atingir. Infelizmente com a guerra na Ucrânia ocorrerá o mesmo.

Luís Alberto Alves, jornalista, editor do blogue cajuísticas.

 

 

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