Cometemos o erro de achar que nunca a morte vai levar nossos familiares e amigos
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O nosso consolo é a entrada na eternidade, onde não há pranto nem tristeza
Luís Alberto Alves/Hourpress
Na quinta-feira passada (13/4) a morte levou embora uma
grande amiga de nossa família. Alguém muito especial. De todas as horas, das
boas e das más. Sempre estava com os ouvidos abertos para nos ouvir,
principalmente quando precisávamos de conselhos. Nos levava para a sua cozinha,
pedia para eu e minha esposa sentarmos e sob várias xícaras de café com pão, biscoitos
ou bolo o diálogo acontecia.
Tudo sem pedir nada em troca. Por amizade, e diga-se de
passagem de mais de 20 anos. Tinha problemas de saúde ocasionados pela idade
(iria completar 68 anos neste dia 30 de abril), porém nada que não pudesse
ficar a cargo da Medicina. Toda a semana a visitávamos. Jamais deixávamos de vê-la.
Às vezes só para jogar conversa fiada. Não gostava de Whatsapp ou qualquer outro
tipo de rede social. Tinha de ser no olho no olho.
Nós cometemos o erro de achar que nunca a morte vai levar nossos
familiares e amigos bem queridos. É algo que só acontecerá com os outros.
Jamais conosco. Ficaremos muitos anos juntos para comemorar as conquistas. É
utopia, porém alimentamos esse sonho, que nunca se concretizará. Infelizmente a
morte baterá na porta de nossas casas
para levar embora alguém querido.
Vídeo
E quando essa terrível senhora chega, a sua força esmaga
corações, mentes e nos deixa prostrados. Ficamos inertes. Sem esboçar qualquer
tipo de reação. Apenas de chorar e lamentar por tudo o que aconteceu. Lembramos
que poderíamos ficar mais tempo com aquele familiar, parente ou amigo ou amiga.
Ir até a sua casa. Fugir da bolha de conversar apenas pelo Whatspp. Ao vivo, é
melhor do que por chamada de vídeo.
Por causa da correria diária, inúmeras pessoas se esquecem
daqueles tão queridos, ocupantes de lugar especial dentro do nosso coração. Andamos
iguais alucinados em busca de rápidos resultados. Ficamos reféns da pressa.
Tudo é para ontem. Quando levantamos de manhã, nem abraçamos fortemente os
filhos, a esposa, o marido, o pai ou mãe. A regra básica é tomar banho rápido,
se vestir, pegar o carro ou metrô ou ônibus e entrar na alucinação do dia.
Planejamos tudo, até o jantar do final do ano, quando ainda
nem chegamos ao segundo semestre, porém se esquecemos de que a morte pode
interromper tudo isto. De repente, num piscar de olhos, ela chega e leva embora
quem tanto amamos, nos jogando nos braços da tristeza, sem nenhum tipo de reação.
Nos iludimos e ignoramos que vivemos no sistema capitalista, onde tudo tem o
seu preço, às vezes bem salgado. Neste tipo de despedida, é caro o pedágio cobrado
pelas empresas funerárias.
Processo
Guardamos dinheiro para todo tipo de coisa. Menos para a embarcação
que nos levará para a última residência: o cemitério!!! Não importa a classe
social e econômica, as pessoas vão passar por ali, mesmo que seja no processo
de cremação. Ninguém escapa. Visto que é crime enterrar alguém dentro do terreno
de sua própria casa. Mas esse problema é contornado, até com a ajuda dos
amigos, que na maioria das vezes são solidários.
O que vai machucar é a dor da partida. De nunca mais estarmos
diante daquela pessoa. De ouvirmos os seus conselhos, sentir o seu abraço, o
seu carinho e palavras para nos encorajar na caminhada. Tudo bem. Existe o
velório, o último momento para a despedida final. Porém quando termina a
cerimônia fúnebre, que testemunhamos o caixão descer à sepultura e ser coberto
pela terra, a dor intensifica dentro do coração. É quando, igual criança,
tentamos querer barrar o tempo. Impedir que ele prossiga. Tudo em vão. Ele
jamais volta.
Hoje, passados quatro dias, da partida desta grande amiga de
nossa família, me levantei e senti o nocaute da tristeza. Tentei fazer as
minhas tarefas profissionais, mas não encontrei forças. Entendi por que as
empresas permitem que funcionários, após a morte de familiares, fiquem em casa
durante três ou mais dias. Sinto como se o chão tivesse sumido embaixo dos meus
pés. E percebo, no alto dos meus 62 anos, que ainda não estou pronto para a
visita da morte, principalmente quando vem buscar alguém tão querido para mim e
minha família. Maria de Lourdes já estamos morrendo de saudade de você!
Luís Alberto Alves, jornalista, editor do blogue Cajuísticas